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Filmes que vi na Semana #2 de 2023 (9-15 de janeiro)

Essa semana não teve nenhum grande filme visto. Segui vendo vários do Oscar, e nenhum muito forte. O melhor mesmo foi um filme que acabou não lembrado, uma experiência queer no exército, que se não chega em Beau Travail, é uma boa contribuição ao cinema norte-americano.

“The Inspection” de Elegance Bratton (2022, EUA) [queer]

Um olhar queer sobre o exército meio original, pelo menos em uma narrativa clássica norte-americana. Jeremy Pope foi indicado ao Globo de Ouro e com razão. Ele vive com perfeição Ellis French um negro gay sem rumo que decide ir para o exército e sofre um bocado quando sua homossexualidade é descoberta, em um papel autobiográfico para o diretor/roterista Elegance Bratton em seu filme de estreia. 

O filme não cai no melodrama e cria relações interessantes e complexas de Ellis não só com seus colegas e superiores em um exército pós-11 de setembro e no auge do Don’t Ask Don’ Tell, mas principalmente com seus dilemas, desejos, e fantasmas interiores. 

Mais Destaques de 2022

“Corsage” de Marie Kreutzer (2022, AUT/LUX/ALE/FRA)

Um olhar melancólico e sereno para a figura de Sissi, a Imperatriz Elizabeth do Império Austro-Húngaro que foi sinônimo de beleza e sensualidade e se vê aos 40 anos, em meio a relacionamentos amorosos e políticos. O filme parte de um realismo históricos e aos poucos, em detalhes, cria seu próprio universo quasi-atemporal para contar a história de uma pessoa que é despida aqui ao mais básico possível, a um corpo em busca do mínimo possível (a cena do corte de cabelos é belíssima) para não se perder em tantas emoções.

É um filme bem bonito visualmente e a câmera tem sim um olhar interessado também para todos aqueles jogos sensuais que rolam entre pessoas bonitas/ricas/poderosas. A parte que dialoga com o nascimento do cinema é super intrigante e ainda que o filme demore para engrenar fica muito poderoso ao fim.

“Minha Pequena Terra” de Emma Kawawada (“My Small Land” / “Mai sumoru rando”, 2022, JAP/FRA)

Um filme delicado sobre um pai e duas filhas que emigraram do Curdistão e vivem na região metropolitana de Tóquio. A história é contada pela filha mais velha, já adaptada à sociedade local, que vê seu trabalho, estudos e relações ameaçados quando o status legal da família perde a validade.

Um filme singelo, aparentemente sem grandes ambições, mas com momentos muito bonitos, em especial

“Vulcões: A Tragédia de Katia e Maurice Krafft” de Sara Dosa (“Fire of Love”, 2022, EUA/CAN)

Ainda não vi o filme do Herzog sobre o casal de vulcanólogos, mas esse filme mais convencional – indicado ao Oscar de documentário – é uma ótima introdução para a vida cheia de aventura e desafios dos dois franceses. As imagens de arquivo são lindas, e a narração de Miranda July não ajuda muito, mas também não atrapalha para mim. 

Outros Filmes de 2022

“Sra. Harris  Vai a Paris” de Anthony Fabian (“Mrs. Harris Goes to Paris”, 2022, RUN/CAN/FRA/HUN/BEL) [longa] indicado ao Oscar de figurino

Nossa, me fez chorar e por essa eu não esperava. Filme bem bonitinho, sessão da tarde total. O final é bem esperado, mas parece que foi alterado, já que no livro, ela só lembra do que viveu e decide que tudo valeu a pena, algo que claro não traduziria bem num filme convencional. 

Lesley Manville, indicada ao Globo de Ouro de melhor atriz em comédia e musical sustenta bem, auxiliada por um excelente elenco coadjuvante, com destaque claro para Isabelle Huppert. Figurinos de Jenny Beavan são belíssimos e define bem cada personagem. Ela venceu três Oscars já por “Uma Janela para o Amor” em 1986, “Mad Max” em 2016 e “Cruella” ano passado.

“Os Anos do Super 8” de Annie Ernaux, David Ernaux-Briot (“Les années Super-8” / “The Super 8 Years”, 2022 FRA) [longa] 

O típico exemplo em que eu não sei se gostei do filme ou só das imagens. Annie Ernaux venceu prêmio Nobel de literatura no fim do ano passado, ou seja, depois do lançamento do filme, e aqui com a ajuda do filho resgata imagens em super-8 filmadas em sua maioria pelo ex-marido, mostrando a desintegração da família em meio ao dia-a-dia e viagens para os paraísos esquerdistas dos anos 1970.

“Utama” de Alejandro Loayza Grisi (2022, BOL/URU/FRA) [longa]

Bonito filme boliviano sobre um jovem que passa semanas na casa dos avós em uma região isolada do Salar. Paisagens contemplativas em meio a uma trama sobre a proximidade da morte.  

“Cine Marrocos” de Ricardo Calil (2021, Brasil)

Belo longa que parte da ocupação do Cine Marrocos por um grupo de moradores de rua para discutir o papel do cinema e de suas salas na sociedade. O cinema foi um dos palcos do Festival Internacional de Cinema de 1954, então o diretor exibe esses filmes e promove uma oficina de teatro para a reencenação de algumas das cenas. No meio disso tudo, ainda consegue pintar um painel complexo da ocupação, mostrando várias faces e visões do que acontece.

“Till – A Busca por Justiça” de Chinonye Chukwu (“Till”, 2022, EUA)

Filme convencional sobre um caso marcante de homicídio racista nos anos 1950, liderados por uma atuação ótima de Danielle Deadwyler, indicada ao SAG.

“Terra de Deus” de Hlynur Pálmason (“Vanskabte land” /  “Godland”, 2022, DIN/ISL/FRA/SUE)

Filme bonito sobre um padre dinamarquês que é enviado para o território islandês para catequizar. Viajando com uma câmera, ele encontra desafios linguísticos já que não consegue aprender o idioma  descobre a terra e seus povos, e a si mesmo no processo. Filme “de cinema”, que não traduz tão bem para a telinha. Foi o indicado da Islândia ao Oscar desse ano.

“The Village Detective: a song cycle” de Bill Morrison (2021, EUA)

Um filme meio perdido e não entendi se era sobre a descoberta de um filme no fundo do mar na Islândia, se era sobre o ator russo, ou sobre o próprio Bill Morrison. A trama que envolve o filme é interessante e deixa com vontade de descobrir mais sobre o ator investigado, mas não dá nenhum pulo.

“A Conspiração do Cairo” de Tarik Saleh (“Boy from Heaven” / “Walad Min Al Janna”, 2022, SUE/FRA/FIN/DIN)

Filme bem feito sobre a disputa de poder na escolha do Grande Imã a partir da visão de um jovem do interior que estuda numa das maiores universidades islâmicas do mundo, a  Al-Azhar que se vê no meio de gente graúda da religião, do exército e da política. As vezes a trama se perde um pouco ou fica bem megalomaníaca mas vale para quem se interessa por política.

“Neil Young: Harvest Time” de Neil Young (2022, EUA)

Obrigatório para fãs de Neil Young, com ótimas imagens de bastidores. Destaques são as conversas com um condutor da Filarmônica de Londres e uma criança que era sensação na rádio de Nashville, mas falta liga ao filme.

“Don Juan” de Serge Bozon (2022, FRA/BEL)

Fui cheio de expectativa para esse musical francÊs, mas saí decepcionado, apesar de um Tahar Rahim radiante.

Descoberta dos arquivos

“Quatro Filhos” de John Ford (“Four Sons”, 1928, EUA)

Que filme lindo. Fala-se muito de um Ford à la Murnau e faz sentido, pois Ford cria aqui toda uma mise en scene bem bonita numa pequena cidade alemã no início do século XX, com personagens coadjuvantes bem escritos e actuados, servindo bem à trama geral: a vida de uma mãezona alemã com seus quatro filhos é impactada com a primeira guerra mundial. O drama atinge níveis extremos na sequência de um reencontro em meio a morte. 

“The Atom Strikes!” de Army Pictorial Service, U.S. Signal Corps (1945,EUA)

Ainda no tema da guerra, um média documental belíssimo sobre os efeitos das bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki. Um dos primeiros relatos da tragédia foi considerado um documento de pesquisa pelo exército americano e na época não foi lançado, ainda que tenha tido sua influência, mencionado no livro de Amos Vogel “Filme como uma arte subversiva”. O áudio do depoimento do jesuíta francês (que é mencionado no famoso livro de John Hershey que li na época de ensino médio) é bem ruim, mas a mensagem é bem clara. 

“The Flipside of Dominick Hide” de Alan Gibson (1980, Reino Unido)

Parte da série de telefilmes “Play for Today” feita para a BBC e parece que teve sua influência e gerou continuações. Um londrino de 2130 que vive numa sociedade pacífica e estável, pousa em 1980 durante uma de suas missões de observação com fins ilegais: encontrar o avô de sua avó, uma criatura que ainda lembra com ternura dos velhos tempos. 

Quem se interessa por filmes futuristas deve curtir esse filme e também quem estiver pesquisando representações de Londres no cinema e televisão, especialmente Notting Hill com suas bagunças e confusões que encantam Dominick. Um filme bonito e que lembra alguns detalhes do roteiro de “De Volta para o Futuro”. 

“Un franco 14 pesetas” de Carlos Iglesias (“1 franco, 14 pesetas”, 2006, ESP)

Um filme muito pessoal para o diretor, filho de espanhois que imigraram para a Suíça na década de 1970. É um filme claramente dividido em duas partes, com altos e baixos em ambas. Sinto ele um pouco travado na história principal, sendo que perde chances de mostrar mais detalhes da adaptação dos dois amigos naquela pequena cidade suíça. O final, visto pelos olhos do personagem autobiográfico é bem bonito.

“Mocidade Heróica” de Hans Steinhoff (“Hitlerjunge Quex: Ein Film vom Opfergeist der deutschen Jugend” / “Our Flags Lead Us Forward”, 1933, Alemanha)

Um marco da literatura nazista de 1932, que foi ao cinema justamente no ano em que Hitler chega ao poder. É um filme muito bem feito, articulado, aparentemente aberto para os sofrimentos e apelos do pai comunista, mas que ao fim julga como um pensamento antiquado para os tempos. 

“Tino” de Guy Hocquenghem, Lionel Soukaz (1985, França) [média] [queer] 

Os diretores são um escândalo mas o filme não traz um bang. Um casal (hétero) americano se interessa por um jovem árabe em viagem a Europa e o traz para sua entourage. Me lembra um pouco o estilo que João Pedro Rodrigues faria depois, mas o filme não vai a lugar nenhum.

“YMO Propaganda” de Makoto Satô (1984, Japão)

Musical japonês, como um grande video-clipe lembrando um pouco a incursão de Prince em Sign o the times – que seria feito três anos depois!

“All My Babies: A Midwife’s Own Story” de George C. Stoney

Um documentário realista sobre parteiras, uma profissão que o documentário narra, estaria em extinção mas ainda é muito importante em comunidades com pouca presença hospitalar. O destaque do filme, claro, é a filmagem bem explícita de um parto, imagens muito marcantes. O filme todo com praticamente uma hora de duração é de uma delicadeza linda. 

“The Dislocation of Amber” de Hussein Shariffe (1975, Sudão) [média]

Média contemplativo de um dos artistas sudaneses mais importantes do século XX. Bonito, mas um pouco difícil de entrar. Fiquei curioso para ver mais coisa dele.

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